Sundries
Notívago, vou para a praia à tarde.
Outono já entrado, já são quatro e meia da tarde e, virado para o sol, ainda sorvo seus raios, nesta Pitangueiras que adoro. Um mergulho, uma nadada, volto a sentar, olho, vejo, escuto.
Outono já entrado, já são quatro e meia da tarde e, virado para o sol, ainda sorvo seus raios, nesta Pitangueiras que adoro. Um mergulho, uma nadada, volto a sentar, olho, vejo, escuto.
Eles agora estão bem alto, sobre a
floresta, arrodeando o Morro da Caixa D’água em seu voo planado e lento;
protetores nossos, bons agentes de saúde pública, em seus sóbrios uniformes
pretos.
Sol agora só entrando n’água; a sombra dos
prédios já cobre toda a faixa de areia. É o que faço; uma mergulhada e ficar na
beira haurindo a carícia do sol até seus últimos suspiros de hoje.
Viro a cadeira para o mar e olho, vejo, escuto,
escuto.
Dois velhotes ali à minha direita se
levantam e vão caminhar; barrigudinhos, tudo bem. Mas como somos deselegantes
os originários de plagas equatoriais e tropicais! Pernas curtas em relação ao
corpo, no mais das vezes atarracados, troncos grossos, mulheres seiúdas e
bundudas. É raro encontrar exemplar longilíneo de pernas longas, raríssimo “una
donna di gambe lunghi, ò anche cosi un ragazzo”...
Por aqui só descendentes de raças nórdicas
ou de algumas tribos africanas possuem leveza do andar e elegância do
corpo. Me encafifei e fui procurar dados
biométricos por raça, região ou país que pudessem explicar estas diferenças.
Nada que preste encontrei. Enviei pedido ao Conselho Econômico e Social das
Nações Unidas. Ainda não responderam. Continuo encafifado. Esteta amador nas horas
vagadas, triste com a desestética nossa.
É hora dos andarilhos, ali vêm três
senhoras moças. Mesma desilusão.
Embora haja um pouco de frescobol durante o
dia, agora é sua hora também. Li, sei lá onde, sobre a diferença entre o tênis
e o frescobol: naquele é um contra o outro, neste um com o outro. Gostei!
Olha que beleza! Uma garça! Solitária,
parece novinha, linda em seu vestido branco, pescoço e bico longos, pernas
altas, elegante. Nunca vi outra aqui. Chegou antes das gaivotas, que não
tardarão. Vêm em bandos em voo suave, elegante, pousam e... são
equato-tropicais... Peitudas barrigudas, perninhosas. Belas de se ver no ar,
tem piado, aliás grasnido, cacofônico. Ao
menos andam com pescoço ereto, sem o vai-e-vem do dos sujos e sugeirentos
pombos que infestaram a praia durante o dia. M’encafifei com este cacoete de
andar dos bichinhos e fui investigar. Um professor da USP explica que
galináceos têm a pélvis dura e quase colada às patas, por isso o movimento:
para se equilibrar. "Tadinhos, né? Quiéque usam para torcicolo?"
Dão rasantes sobre a beira do mar, pousam e
bicam a areia, entram um pouco nas pequenas ondas, bicam... Não sei o que ali
encontram para... Oi! Aquela, pelo esforço que fez para engolir acho que pegou
um peixinho.
Aí eu disse, que não, que estava na
Paulista, aí ela disse que fez um bolo pra Aninha que ia lá e aí disse preu ir
também, aí eu disse que eu então eu ia, mas perguntei se a Marcela também não
ia, aí ela disse que já tinha convidado, aí eu disse que ia. Aí eu fui e a
Marcela chegou logo, e o bolo tava uma delícia. Aí eu ia sair e caiu aquela
chuvarada aí ela disse preu jantar lá...
Papo de mulher na praia.
Olha aquela ali! Parece um homem com os
olhos saltados, careca, com a cabeleira das têmporas voando pra trás. Que nem
que eu forando os olhos saltados.
E aquela outra, um peixe longo tinto de
lâminas alaranjadas. Êpa! O bico mudou, virou bocarra de moreia.
É tempo de nuvens, claras e escuras, se
enfeitarem com as cores do fim de por de sol e estimularem a imaginação. Mais
festa para olhos, cuca e alma.
O que será que aqueles dois grupinhos estão
fazendo, varrendo a areia na beira das ondas com sacos vermelhos?
Fui lá olhar; os sacos são de tecido
plástico furadinho.
– Por curiosidade, o que você está fazendo?
– Caçando minhoca da praia pra isca de
pesca.
O careta olhou e examinou a areia, meteu as
duas mãos em concha num lugar em que eu não via nada e puxou uma das tais
minhocas, fina e longa pra burro, enfiou-a num plástico que levava à cintura.
Ah! Agora entendo o que as gaivotas
procuram na areia da arrebentação das ondinhas. Cultura inútil? Não creio que
haja cultura inútil. Deixa a informação lá no sótão.
Um dos navios da longa fila de espera para
entrar no porto acendeu as luzes. Agora outro, e outro, todos. Enfeitam mar e horizonte com um colar de
pérolas, umas resplandecentes, outras mais recatadas; algumas pulsantes.
Aqui o dia todo é festa, desde manhãzinha
com a arribada dos jangadeiros da areia, a balbúrdia e algazarra de crianças e
jovens... Cenário e atores se revezam e trocam.
Magnífico, incrível espetáculo!
E não se paga ingresso! É só estar, olhar,
ver, ouvir, se maravilhar.
FMFG
Abril de 2013
Flávio,
ResponderExcluirQUE DELÍCIA!
Gostei muito de compartilhar a tarde na praia contigo.
Conta mais, por favor, que já assumi a postura de ouvinte. Obrigada!
Norma.
P.S.: Há muito não vejo/leio um 'encafifado' usado com tanta propriedade :) Nac♥
Obrigado, minha ouvinte querida!
ResponderExcluirTê-la como "ouvinte" é enorme prestígio e incentivo.
Gostaria muito de ser seu 161o ouvinte também, mas ainda não encontrei seu blog!
Beijo agradecido e carinhoso.
Ah, Poeta, não o tenho, mas nos 'esbarramos', com frequência, no espaço da Marligo, via pela qual vim a conhecer o seu.
ExcluirAgora, se e quando, de um for a feliz proprietária, serás um dos primeiros a saber: Gosto de pessoas que sabem ser gentis consigo próprias, para começar...
Boa Sorte, Norma