terça-feira, 18 de março de 2014

O ninho.

Reminiscências



Casei-me algumas vezes; formalmente três.

A cada vez construíamos ninhos, a cada vez um ou mais de um, ao sabor das desejadas ou forçadas migrações.

Começaram sempre com a escolha da árvore ou arbusto, do jeitão dos pássaros e bichos da vizinhança, examinar um abandonado a ver como estava, como poderia vir a ser ninho de amor, onde criar possíveis futuros passarinhos, realizar nossos sonhos. Anseios, projetos sonhados... E acomodações à realidade possível.

Dois na gostosa e cansativa busca por raminhos e folhas, a corrida de encontros, desencontros e discussões com pássaros a que pedimos ajuda; exaustivas idas e vindas em busca de pedacinhos desejados, utilidades e inutilidades.

Ao final, nosso ninho, cada um lindo e gostoso.

Os filhotes, alimentamos e tratamos com cuidado, ensinamos a voar. E se foram.

Também se foram os casamentos. Cada partida uma chegada sofrida ao amor e amizade verdadeiros, sem véus, sem máscaras, mais nus como nos sabíamos, mais companheiros para sempre.

Desta vez, ave migratória que sempre fui, construir ninho para sempre, penso eu, – ainda que desejado -, abala velhas estruturas e crenças. Aqui ficarei vendo e vivendo as mesmas cenas como o personagem de 2001 Uma Odisseia no Espaço, cada dia me revendo o mesmo que o anterior, alimentado, só envelhecendo, esperando...?

Vou, entretanto, curtindo cada pequena coisa, pequena etapa, dúvida, decisão, procura e encontro de um ramo ou folhagem; cada um é achado importante, um pedaço do sonho viável. E os trago em meu bico, andante ou de carona sobre  moventes coisas.

Ainda está distante do planejado, mas, por enquanto, cada adendo é uma conquista, grande alegria. Da beira aprecio a vista magnífica, privilegiada. Valeu!

O projeto inclui a espera e acolhida de amigos; não dá pra muitos de vez, quatro ou cinco sem dúvida, até sete se acampados...

Me bateu mais forte a realidade da espera pela finitude.

Creio entender: agora é ninho só meu, meu para até quando.


FMFG – Março de 2014


Foto de Adilson C. Constantini


quinta-feira, 6 de março de 2014

Feras domadas.

 Sundries


Elas vêm em hordas, bramindo, deixando revoltas nuvens brancas em seu tropel.

Chegam a meus pés e o lambem, domadas, mal murmurando arrulhos.

E vêm outras atrás, tudo se repete, e repete. Festa para olhos e ouvidos.

É finalzinho de final de férias, praia ainda cheia cinco e meia da tarde. Forando eu e os “Jangadeiros da Areia”, a que já me referi, creio que poucos “nativos” ainda estejam aqui.

Cai a tarde sem barulho, de mansinho, sem controle, como deve. É privilégio de poucos a curtir e entender.

Com este calor extremo (de que não reclamo) beija flores não mais vêm beber em nossos bebedouros, pombas chegam mais tarde, e gaivotas só quase à noite. Só os urubus estão lá em cima, bem acima, sobre morros e florestas, num céu todo azul, sem nuvens que nos incitem a sonhos, sem nos deixar mensagens.

Este pai, ótimo professor, treina o filho a controlar a bola, todos os dias. O pequeno progride.



Não deu para olhar sem muito disfarçar, mulherada em trajes mínimos, biquínis e fios dentais; esta, em biquíni tradicional, é uma escultura, uma beleza rara e incrível! Nem olha a seu redor; sabe-se linda e objeto de admiração ou desejo da marmanjada. Despreza a todos. Talvez venha a lamentar ter perdido alguém que a amasse e a quem pudesse amar.



Priiii priii, apita o guarda-vidas.

Estes estrangeiros não entendem o que seja a faixa vermelha entre três estacas de “Perigo”. Pitangueiras é segura, mas uma “falsa segura”, segundo os guarda vidas. Tudo bem fora e se possível longe, para a esquerda ou direita da faixa.

Há duas correntes, da direita e da esquerda, que jogam a gente no canal que é profundo e leva a quem lá se perder para a direita, até as pedras das Astúrias; nada de muito sério se você não se apavorar, mas “gringos” e até nativos distraídos se apavoram e, sem ajuda, se afogam.

O porto de Santos deve estar descongestionado: deste ponto já cheguei a contar 16 navios em espera, e estou longe ainda da entrada do porto. Hoje são só três, um cargueiro e dois tanqueiros. Já está difícil ter certeza com a bruma que se avoluma ao longe, logo mais serão luzes bordejando a linha d’água.

Está na hora dos jangadeiros da areia recolher velames e tralhas e ir repousar. Aqui no pedaço de praia a que sempre venho há o Mané, o Chicão e o Bola; mais para a direita o JF Pastéis. O Bola sempre fica até mais tarde, JF até que mais ninguém querendo qualquer coisa; mas se chego cedo sou freguês do Chicão. E lá vem ele assoviando suas músicas que ninguém entende, mas se sabe que é ele que está por perto.

- Oi, patrão, vai uma caipirosca?

- Obrigado, Chicão, hoje só vou de água de coco.

Vou também ser chacoalhado na lavanderia do mar duas ou três vezes. Volto à minha cadeira, mais sol que me lambe e amorenece, mais brisa que me seca, mais um cigarro, e volto à lavanderia donde saio cansado e refeito.

Fico ali até quase 8 da noite, olhando o mar e os últimos reflexos do sol nos prédios lá de Astúrias, ensimesmado.



Onde estão as flechas que este velho guerreiro disparou?

Sonho encontrá-las todas, se não amanhã depois, depois, mas sempre.

Acordo com a marola batendo a meus pés; lua nova, maré encheu rápido. Perfume e bruma de maresia invadem a mim, meu redor, toldam vista e visões. Assim se pode ver melhor...

FMFG


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