quarta-feira, 24 de abril de 2013

Paliativo




É paliativo?

O que?

Não entendi, mas minha filha respondeu para a enfermeira que sim.

De tudo, isto é o que mais me pesa e dói até hoje.

O logo antes e o depois já foram, a muito custo, digeridos, entendidos creio; inclusive com pequenas passagens alegres, divertidas ou ao menos engraçadas.

Paliativo foi e é ainda demais.

Ele é a presença que sempre foi e será sempre, do maninho sapeca, malandro, sempre aprontando tantas, sempre moleque, sonhador inconstante, mas trabalhador sim, meu maninho, meu quase que alter ego, eu que também fui e sou um tanto assim.


Logo ou um pouco antes me comovi com ele escovando os dentes e ensinando como isto era bom, com as pitadinhas que demos ele encostado à janela, das mentalizações que fiz, agarrado às suas mãos ou passando minha mão em seu corpo, mandando que as células doentes se transformassem em autofágicas comedoras das outras...

Maninho, tudo isto ainda era bom, havia sempre um fio, tênue, improvável, mas havia em mim, em nós todos, esperança do milagre.

“Paliativo” acabou comigo! Acabou e me acaba até hoje.

Logo e nos poucos dias depois o beijei, abracei, e de mãos dadas nós dois sonhávamos viajar num veleiro lindo, muito melhor que o que sua irmãzinha fez de tudo pra lhe dar. Ela, que não teve outro irmão assim, o adora e me diz que sim, seu veleiro é beleza!

Imagens de você muito pequenino, sentado ao penico, odiando o cheiro de seu próprio cocô, mãozinhas tapando o nariz com o lenço com perfume que a mãe lhe dava, dizendo “Espera, ainda tem um pouco aqui na cabecinha”.

Você e a meio-prima, pequeninos na porta de casa, sentados sobre as pernas, fingindo-se amputados, vendendo revistinhas velhas.

Você trazido às costas e o irmão do meio arrastado à mão, bebadinhos ao encher as garrafas de vinho dos frades dominicanos, você que caiu de cabeça fazendo ginástica do portão, que levou à mãe divinatória, ainda no hospital, a ligar para todos para saber de você.

Você, malandro que cabulava aulas no Santo Agostinho para farrear com seu xará. Que tanto nos ocuparam as conversas e preocupações na universidade que não chegou a concluir.

Que batalhou como atendente comercial e de pista em São Paulo, depois atendente comercial em Recife, onde encontrou a maravilhosa menina com quem se casou.

Você de volta aqui, empreendedor e companheiro meu comprando e comercializando sucata.

Você maluquinho comprando seus barcos e veleiros, que foram tragados com o fim da Cofavi e de sua empresa.

Você que teve sonhos de amores malditos de que, além da esposa sempre amada, só sobrou um verdadeiro e que durou tão pouco.

Você, querido de que me sobra tanto e tão pouco,

Não aguento, nunca me acostumarei com o

Paliativo. 




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