Trecho de “Minhas Reminiscências”
Eu saía “para trabalhar” lá no cubículo.
Pelo menos até os primeiros meses de 98 quando até a consultoria da Excell
também acabou.
Todas as manhãs depois da primeira semana
ou dez dias de dezembro Dª. Mãe (como eu a chamo desde então) me dizia que
precisava ir ao Pão de Açúcar comprar alguma coisinha para o Natal. – “Deixe
que estou tratando disso, não se preocupe”.
Pedro pediu uma fita de videogame que tinha
sido recém-lançada no Brasil, “Zelda”. Prometi que a teria. Criança sabe e
sente tudo que se passa; também sofria imaginando que eu não conseguiria
atendê-lo. E, já então, quase todos seus amiguinhos do Portal e colegas de
escola tinham a fita!
O meu eu íntimo não teve dúvidas, procurou o
tal agiota e fez um empréstimo de 10 mil Reais, a 10% ao mês.
Fui buscar a grana (9 mil pois os primeiros
10% já vinham descontados) numa casa tipo pequeno palacete um tanto decrépito, cor
amarelo-sujo, em uma pracinha escondida a que se tem ainda hoje acesso por uma
rua estreita que sai da Av. Rodrigues Alves lá mais para o alto.
Mesmo antes de acionar a campainha um cão
latia na lateral da casa.
Alguém apareceu por momentos através dos
vidros da porta de entrada e desapareceu. Penso que tenha ido prender o “latinte”.
Voltou, abriu o portão da mansão, desceu e
abriu o de entrada para mim. Aquelas babaquices usuais e me guiou para a
entrada.
Todo o térreo, desde a entrada estava cheio
de caixas, mostruários, araras, estantes, com um monte de bugigangas, tudo na
maior bagunça. Subindo a escadaria, o primeiro andar era repetição do térreo,
com uma pequena diferença: um monte de caixas de eletro-eletrônicos.
O “escritório” do cara não podia ser
diferente, né?
Ninguém mais na casa, só ele e seu cão;
agora eu também.
Fez questão de me informar que era
estreitamente ligado a políticos e policiais-políticos famosos e conhecidos,
alguns ainda politicando até hoje, meus conhecidos dos tempos de Vasp e de
opulência; que ele ajudava em suas campanhas...
Entendi o recado: era pagar ou “ser
sumido”.
Embora não tivesse mais o seguro fabuloso,
naquela situação seu discurso só me fez rir (por dentro, lógico).
Toda esta operação de achar o agiota e
fechar o acordo fez com que só tivesse dinheiro livre pouco antes do dia 20.
No dia seguinte fui com Dª. Mãe ao
Supermercado. Ela cuidando para não gastar muito; eu fazendo questão de que
houvesse tudo de que ela gostava e em quantidade para que ela fizesse sua ceia
e almoço de Natal para toda a família sem muito excesso, mas com fartura.
Alegre como uma criança que já tivesse
recebido seu presente do Papai Noel, se ocupou em tratar de assar o pernil, ou
lá o que tenha sido, se esbaldou na cozinha, na arrumação da casa e da mesa, e
em produzir suas famosas e requisitadas rabanadas ou fatias do céu, como as
queiram chamar.
Sufoco foi conseguir o raio da “Zelda”!
Coqueluche do momento – e com razão como vim a descobrir acompanhando o Pedro
em sua saga para salvar a princesa – estava esgotada em todos os lugares
possíveis!
Recorri ao pessoal da Première, locadora da
qual eu era sócio há muito tempo. Pedi que procurassem para mim, não importava
o ágio se existisse (afinal ágio seria meu companheiro e algoz por mais 10
meses...).
Dois dias de angústia e tristeza profunda:
toda a minha saga parecia ter sido inútil para que eu cumprisse minha promessa
para com o Pedro.
Quando me telefonaram dizendo que haviam
reservado a última que uma de suas filiais tinha em Perdizes, saí imediatamente
e a comprei. Não vinha com a caixa bonita, mas era nova e virgem e com a
embalagem interna original. Paguei 120 Reais, preço normal.
Não tenho como descrever minha alegria de
pai, de pai de um garotinho que passara e estava passando por dificuldades e
traumas, ao vê-lo abrindo o pacote na manhã de 25. Imagino que sua alegria
pelos olhinhos brilhantes, pelos beijos e abraços que me deu, tenha sido
enorme. Certamente não tão grande quanto a minha.
FMFG
Nenhum comentário:
Postar um comentário