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Prefácio
As revoluções científicas, quase que por definição, contestam o senso comum.
Se todas as nossas noções de senso comum sobre o universo fossem corretas, a ciência teria decifrado os segredos do universo há milhares de anos. O propósito da ciência é remover a camada da aparência dos objetos para revelar sua natureza subjacente. De fato, se aparência e essência fossem a mesma coisa, não haveria necessidade de ciência.Talvez a noção de senso comum mais profundamente arraigada acerca de nosso mundo seja a de que ele é tridimensional. Nem é preciso dizer que comprimento, largura e profundidade são suficientes para se descrever todos os objetos de nosso universo visível.
Experimentos realizados com bebês e animais mostraram que nascemos com um senso inato de que nosso mundo é tridimensional. Se incluirmos o tempo como uma outra dimensão, quatro dimensões são suficientes para o registro de todos os eventos no universo. Não importa onde nossos instrumentos tenham penetrado, desde as profundezas do átomo até os mais remotos confins do aglomerado galáctico, só encontramos evidência dessas quatro dimensões.
Afirmar publicamente outra coisa, sugerir que pode haver outras dimensões ou que nosso universo pode coexistir com outras, é provocar certa zombaria.
No entanto, essa ideia preconcebida e profundamente arraigada sobre nosso mundo, surgida pela primeira vez das especulações dos antigos filósofos gregos dois milênios atrás, está prestes a sucumbir ao progresso da ciência.
Este livro trata de uma revolução científica
criada pela teoria do hiperespaço que afirma a existência de dimensões além das
quatro de espaço e tempo comumente aceitas.
Há um crescente reconhecimento entre físicos do mundo inteiro, entre os quais vários contemplados com o prêmio Nobel, de que o universo pode realmente existir num espaço de maior número de dimensões. Se sua correção for provada, essa teoria irá criar uma profunda revolução conceitual e filosófica em nossa compreensão do universo.
Nos meios científicos, a teoria do hiperespaço é conhecida como teoria Kaluza-Klein e supergravidade.
Sua formulação mais avançada, porém, é chamada de teoria das
supercordas, a qual chega a prever o número preciso de dimensões: dez. As três
dimensões habituais do espaço (comprimento, largura e profundidade) e uma de
tempo são agora acrescidas de seis outras dimensões espaciais.
Advertimos que a teoria do hiperespaço ainda não foi experimentalmente confirmada e que, de fato, seria extraordinariamente difícil
prová-la em laboratório.
No entanto, a teoria já empolgou os mais importantes
laboratórios de física do mundo e alterou irreversivelmente a paisagem
científica da física contemporânea, gerando um assombroso número de artigos de
pesquisa na literatura científica (mais de cinco mil, segundo um cálculo).
No
entanto, quase nada foi escrito para explicar ao público leigo as fascinantes
propriedades do espaço com maior número de dimensões. Em consequência, o grande
público tem apenas uma vaga ideia, se é que tem alguma, dessa revolução.
De fato, as referências superficiais a outras
dimensões e universos paralelos feitas na cultura popular são frequentemente
enganosas.
Isso é lamentável porque a importância da teoria reside em seu poder
de unificar todos os fenômenos físicos conhecidos numa estrutura espantosamente
simples.
Este livro torna disponível pela primeira vez, uma exposição
cientificamente fundamentada, acessível,
da fascinante pesquisa atual sobre o hiperespaço.
Para explicar por que a teoria do hiperespaço gerou tanto
entusiasmo no mundo da física teórica, desenvolvi quatro temas fundamentais que
atravessam todo este livro como um fio- Estes quatro temas dividem o livro em
quatro partes.
Na Parte I, desenvolvo os primórdios da
teoria do hiperespaço, enfatizando a ideia de que as leis da natureza se tornam
mais simples e mais precisas quando expressas em maior número de direções.
Para
compreender como o acréscimo de mais dimensões pode simplificar problemas
físicos, considere o seguinte.
Para os egípcios antigos, o tempo era um
mistério completo. O que causava as estações? Por que a temperatura era mais
alta quando viajavam para o sul? Por que os ventos sopravam geralmente de uma
só direção? Era impossível explicar o tempo a partir da posição dos egípcios
antigos,
para os quais a Terra parecia ser chata,
como um plano bidimensional.
Mas agora imagine enviar os egípcios num foguete
para o espaço exterior, onde possam ver a Terra em sua simplicidade e inteireza
em sua órbita em torno do Sol. De repente, as respostas para essas perguntas se
tornam óbvias.
A partir do espaço cósmico, é evidente que o eixo da Terra
está inclinado cerca de 23 graus da vertical (a "vertical" sendo a
perpendicular ao plano da órbita da Terra em torno do Sol).
Por causa dessa
inclinação, o hemisfério norte recebe muito menos luz solar durante uma parte
de sua órbita que durante outra parte. Por isso temos inverno e verão.
E como o
equador recebe mais luz solar que as regiões polares norte e sul, a temperatura
se eleva à medida que nos aproximamos do equador.
Da mesma maneira, como a
Terra gira no sentido anti-horário para alguém postado no polo norte, o frio ar
polar dá uma guinada ao se mover rumo ao sul em direção ao equador. O movimento
das massas de ar quentes e frias, desencadeado pela rotação da Terra, ajuda
assim a explicar por que os ventos sopram geralmente numa só direção,
dependendo de onde você esteja na Terra.
Resumindo, as leis
um tanto obscuras que regem o tempo são de fácil compreensão desde que vejamos
a Terra a partir do espaço.
A solução para os problemas consiste, portanto, em
subir no espaço, rumo à terceira dimensão.
Fatos que são impossíveis de
compreender num mundo plano tornam-se subitamente óbvios quando se vê uma Terra
tridimensional.
De maneira análoga, as leis da gravidade e da luz parecem totalmente
dessemelhantes. Elas obedecem a pressupostos físicos e a matemáticas
diferentes.
As tentativas de reunir essas duas forças sempre fracassaram.
No
entanto, se acrescentamos uma dimensão a mais, uma quinta dimensão, às quatro
dimensões anteriores de espaço e tempo, as equações que governam a luz e a
gravidade parecem se encaixar como duas peças de um quebra-cabeça.
De fato, a
luz pode ser explicada como vibrações na quinta dimensão. Dessa forma, vemos
que as leis da luz e da gravidade se tornam mais simples em cinco dimensões.
Consequentemente, muitos físicos estão
agora convencidos de que uma teoria quadridimensional convencional é
"pequena demais" para descrever adequadamente as forças que comandam
nosso universo. Numa teoria quadridimensional, os físicos têm de espremer as
forças da natureza de uma maneira desajeitada, artificial. Além disso, essa
teoria híbrida é incorreta.
Quando nos expressamos a partir da posição dos egípcios antigos,
para os quais a Terra parecia ser chata, como um plano bidimensional, é mais do que impossível
explicar o tempo.
Na Parte II, elaboramos mais essa ideia simples,
enfatizando que a teoria do hiperespaço pode ser capaz de unificar todas as
leis da natureza conhecidas numa única teoria.
Assim a teoria do hiperespaço
pode vir a ser a realização que coroará dois milênios de investigação
científica: a unificação de todas as forças físicas conhecidas. Ela pode nos
dar o Santo Graal da física, a "teoria de tudo" que escapou a
Einstein por tantas décadas.
Neste último meio século, os cientistas deram tratos à bola
para entender por que as forças básicas que mantêm o cosmo coeso — gravidade,
eletro magnetismo e as forças nucleares forte e fraca — diferem tanto.
Tentativas feitas pelos mais extraordinários cérebros do século XX para
fornecer um quadro unificador de todas as forças conhecidas falharam. A teoria
do hiperespaço, contudo, abre a possibilidade de se explicar as quatro forças
da natureza, bem como o conjunto aparentemente aleatório das partículas
subatômicas de uma maneira verdadeiramente precisa.
Na teoria do hiperespaço, a
"matéria" também pode ser vista como as vibrações que se encrespam
através do tecido do espaço e tempo.
Disto se segue a fascinante possibilidade
de que tudo que vemos à nossa volta, das árvores e montanhas às próprias
estrelas, nada mais sejam que vibrações no hiperespaço. Se for verdade, isso
nos dá um meio preciso, simples e geométrico de fornecer uma descrição coerente
e incontestável de todo o universo.
Na Parte III, exploramos a possibilidade de que, sob
circunstâncias extremas, o espaço possa ser esticado até se rasgar ou romper.
Em outras palavras, o hiperespaço pode fornecer um meio de cavar um túnel
através do espaço e tempo.
Embora enfatizemos que isto ainda é extremamente
especulativo, os físicos estão analisando seriamente as propriedades dos
"buracos de minhoca", de túneis que ligam partes distantes do espaço
e tempo.
Físicos que trabalham no California Institute of Technology, por
exemplo, propuseram seriamente a possibilidade de se construir uma máquina do
tempo que consistiria em um buraco de minhoca que conectaria o passado com o
futuro. Hoje as máquinas do tempo já deixaram o reino da especulação e da
fantasia e se tornaram campos legítimos de pesquisa científica.
Cosmólogos chegaram mesmo a propor a
possibilidade sensacional de que nosso universo seja apenas um em meio a um
número infinito de universos paralelos. Esses universos poderiam ser comparados
a um vasto conjunto de bolhas de sabão suspensas no ar.
Normalmente, o contato
entre esses universos-bolha é impossível, mas, analisando as equações de
Einstein, Cosmólogos mostraram que poderia existir uma rede de buracos de
minhoca, ou tubos, que conectariam esses universos paralelos.
Em cada bolha,
podemos definir nosso próprio espaço e tempo distintivos, que só têm sentido em
sua superfície; fora dessas bolhas, espaço e tempo não têm sentido algum.
Embora muitas consequências dessa discussão sejam puramente
teóricas, a viagem no hiperespaço pode acabar por propiciar a mais prática de
todas as aplicações: salvar vida inteligente, inclusive a nossa, da morte do
universo.
Os cientistas estão totalmente convencidos de que o universo
terminará por morrer, e com ele toda a vida que evolveu ao longo de bilhões de
anos.
Por exemplo, segundo a teoria prevalecente, chamada Big Bang, uma
explosão cósmica ocorrida de 15 bilhões a 20 bilhões de anos atrás fez o
universo se expandir, arremessando estrelas e galáxias para longe de nós com
grandes velocidades.
No entanto, se um
dia o universo parar de se expandir e começar a se contrair, ele acabará
sucumbindo num cataclismo abrasador, chamado o Big Crunch, ou Grande
Esmigalhamento, em que toda vida inteligente será vaporizada por fantástico
calor.
Alguns físicos, contudo, conjeturaram que a teoria do hiperespaço talvez
forneça a única esperança possível de um refúgio para a vida inteligente. Nos
últimos segundos da morte de nosso universo, a vida inteligente poderia escapar
ao colapso fugindo para o hiperespaço.
Na Parte IV, concluímos com uma questão prática, final: se
a teoria do hiperespaço se provar correta, quando seremos capazes de utilizar
sua força?
Esta não é uma questão meramente acadêmica, porque, no passado, a
utilização de apenas uma das quatro forças fundamentais transformou
irreversivelmente o curso da história humana, alçando-nos da ignorância e da
miséria das antigas sociedades pré-industrializadas para a civilização moderna.
Em certo sentido, até o vasto percurso da história humana pode ser visto sob
uma nova luz, em termos do progressivo domínio de cada uma das quatro forças.
A
história da civilização sofreu uma profunda mudança à medida que cada uma
dessas forças foi descoberta e controlada.
Por exemplo, ao formular as leis clássicas
da gravidade, Isaac Newton desenvolveu a teoria da mecânica, que nos deu as
leis que governam as máquinas.
Isso, por sua vez, acelerou enormemente a
Revolução Industrial, que desencadeou forças políticas que acabaram por
derrubar as dinastias feudais da Europa.
Em meados da década de 1860, quando
formulou as leis fundamentais da força eletromagnética, James Clerk Maxwell
inaugurou a Idade Elétrica, que nos deu o dínamo, o rádio, a televisão, o
radar, os aparelhos eletrodomésticos, o telefone, o forno de microondas,
aparelhos de som e videocassete, o computador eletrônico, os lasers e muitas
outras maravilhas eletrônicas.
Sem a compreensão e a utilização da força
eletromagnética, a civilização teria estagnado, congelada num tempo anterior ao
da descoberta da lâmpada e do motor elétrico.
Em meados da década de 1940,
quando a força nuclear foi utilizada, o mundo virou mais uma vez de cabeça para
baixo com o desenvolvimento das bombas atômica e de hidrogênio, as mais
destrutivas armas sobre o planeta.
Como não estamos no limiar de uma
compreensão unificada de todas as forças cósmicas que governam o universo,
podemos prever que qualquer civilização que domine a teoria do hiperespaço se
tornará senhora do universo.
Como a teoria do hiperespaço é um corpo bem definido de
equações matemáticas, podemos calcular com precisão a energia necessária para
torcer o espaço e o tempo num nó ou para criar buracos de minhoca ligando
partes distantes de nosso universo.
Infelizmente, os resultados são
decepcionantes. A energia requerida excede em muito tudo que nosso planeta pode
reunir. De fato, a energia é um quatrilhão de vezes maior que a energia de
nossos maiores aceleradores de partículas.
Teremos de esperar séculos ou mesmo
milênios até que nossa civilização desenvolva a competência técnica para
manipular o espaço-tempo, ou depositar nossas esperanças num contato com uma
civilização avançada que já tenha dominado o hiperespaço.
O livro termina,
portanto, explorando a questão científica intrigante, mas especulativa de qual
seria o nível de tecnologia necessário para que pudéssemos nos tornar senhores
do hiperespaço.
Como a teoria do hiperespaço nos leva para muito além das
concepções normais, de senso comum, do espaço e tempo, espalhei por todo o
texto algumas histórias puramente hipotéticas.
Fui inspirado a utilizar essa
técnica pedagógica pela preleção do ganhador do prêmio Nobel Isidor I. Rabi
diante de uma plateia de físicos.
Ele lamentou o estado calamitoso da educação
científica nos Estados Unidos e repreendeu a comunidade dos físicos por
negligenciar seu dever na popularização da aventura da ciência para o grande
público e especialmente para os jovens.
Na verdade, ele advertiu, os escritores
de ficção científica haviam feito mais para comunicar o romance da ciência que
todos os físicos somados.
Num livro anterior, Beyond
Einstein: The Cosmic Quest for the Theory of the Universe (em co-autoria com
Jennifer Trainer), investiguei a teoria das supercordas, descrevi a natureza
das partículas subatômicas e discuti detidamente o universo visível e como
todas as complexidades da matéria poderiam ser explicadas por minúsculas cordas
vibrantes.
Neste livro, expandi-me sobre um tema diferente e explorei o
universo invisível — isto é, o mundo da geometria e do espaço-tempo.
O foco
deste livro não é a natureza das partículas subatômicas, mas o mundo
multidimensional em que elas provavelmente vivem.
No processo, os leitores
verão que o espaço multidimensional, longe de ser um pano de fundo passivo e
vazio contra o qual os quarks desempenham seus eternos papéis, torna-se realmente
o ator central no drama da natureza.
Ao discutir a fascinante história da
teoria do hiperespaço, veremos que a busca da natureza última da matéria,
iniciada pelos gregos há dois milênios, foi longa e tortuosa.
Quando o capítulo
final dessa longa saga for escrito por futuros historiadores da ciência, eles
poderão sem dúvida registrar que o avanço decisivo foi a derrota das teorias de
três ou quatro dimensões fundamentadas no senso comum e a vitória da teoria do
hiperespaço.

